quarta-feira, 28 de julho de 2010

Comparar-te a um Dia de Verão?

Comparar-te a um dia de verão?
Há mais ternura em ti, ainda assim:
um Maio em flor às mãos do furacão,
o foral do verão que chega ao fim.
Por vezes brilha ardendo o olhar do céu;
outras, desfaz-se a compleição doirada,
perde beleza a beleza; e o que perdeu
vai no acaso, na natureza, em nada.
Mas juro-te que o teu humano Verão
será eterno; sempre crescerás
indiferente ao tempo na canção;
e, na canção sem morte, viverás:
Porque o mundo, que vê e que respira,
te verá respirar na minha lira.

William Shakespeare, in "Sonetos"

segunda-feira, 12 de julho de 2010

A propósito das SCUT´s

A propósito das SCUT´s

A propósito das SCUT´s… e após a leitura de um artigo de opinião publicado pelo Correio da Manhã – jornal que raramente leio pois não aprecio particularmente, por o conotar com uma espécie de “Diário de um Serial Killer”.
Um domingo destes, enquanto tomava café, detive-me na leitura transversal do Diário e, surpreendentemente ou não, prestei atenção a um artigo da autoria do Dr. Francisco Moita Flores. Fiquei sem perceber se o escrevia na qualidade de escritor, ex-agente criminal, investigador, ou na qualidade de Presidente da Câmara.
Presumindo que o fez enquanto edil de Santarém, o Dr. Moita Flores impressionou-me, desta vez e ao contrário do habitual, pela negativa.
O próprio revela dificuldade em perceber o que se entende por Discriminação Positiva, baseada na ideia da existência de portugueses diferenciados, afirma mesmo que admitir uma diferença de estatuto económico, de estatuto diferenciado, não ia de encontro às suas convicções.
Mais acrescenta que os moradores da margem Sul do Tejo e que diariamente atravessam o rio, sendo que para tal pagam um título de transporte de forma a se deslocarem para os seus locais de trabalho, são aqueles que são discriminadas de modo negativo. Eu pergunto, será que Moita Flores desconhece que, por exemplo, o Metro e a Carris que todos os dias, meses e anos asseguram o transporte destes Portugueses, dão ao Estado prejuízo. Lembro que todos nós cidadãos contribuímos com os nossos impostos para a manutenção desses serviços, dos quais nem todos usufruímos. Entendamos então que a discriminação positiva também existe na capital.
Não cabe discutir aqui esta e muitas outras formas de discriminação do Litoral face ao Interior, até porque estou ciente que, muitas dessas pessoas descritas por Moita Flores, são oriundas do Interior do país. Vítimas de deslocações forçadas pela discrepância profundíssima de empregabilidade. Aqui sim, reside uma discriminação administrativa e jurídica no nosso território para com os portugueses do Interior.
Detenhamo-nos nas SCUT´s que para Moita Flores só poderão cingir-se a uma regra, adequada à série de dificuldades económicas criadas pela crise global e transversal que o país atravessa: Quem utiliza paga! Eu não me desloco, logo não tenho que contribuir para a manutenção destas SCUT´s.
Depois de reflectir sobre este axioma, deduzo a necessidade de contabilizar outras premissas e refutar tal ideia. O cidadão do Distrito da Guarda entende justa a Discriminação Positiva, e lutará pela isenção no pagamento das SCUTS, nomeadamente na A23 e A25 baseada em pressupostos, entre os quais:
- Na própria génese, a construção do IP5, transformado posteriormente em A25, financiado com Fundos da União Europeia, salientando-se então a isenção de portagens.
- Na época, o Interior foi gravemente discriminado na construção do IP5. Como reconheceu anos mais tarde o então Ministro Ferreira do Amaral, existiam 2 formas de construir um eixo rodoviário de Vilar Formoso/Aveiro, uma Auto-Estrada ou um IP. Foi então decidida a construção de um IP, sendo que a restante verba veio, mais tarde, a permitir a construção da CREL;
- Pela própria definição de SCUT (“Sem Custo para os Utilizadores), justificada por uma efectiva coesão nacional e territorial;
- Pelos indicadores do desenvolvimento socioeconómico, claramente inferiores à média nacional;
- Na realidade que um cidadão do Interior tem forçosamente que se deslocar ao Litoral para resolver enumeras questões nos mais diversos serviços que se encontram longe das suas realidades locais, situação que não encontra reciprocidade, ou seja quem vive no Litoral não necessita de se deslocar ao Interior para resolver os seus problemas. Pergunto, haverá alguém decidido ou que se quer pense transferir Ministérios e outros Serviços Centrais para o Interior do nosso País?
- Nos rendimentos auferidos pelas cidades do Litoral através do investimento público (Universidades, Hospitais e outros Serviços) que se tornam fontes de emprego e de rendimento. Vejamos, todos os anos assistimos à procura de milhares de jovens do nosso Distrito de escolas e Universidades nos grandes centros urbanos, uma deslocação que obriga a que estes jovens e seus pais tenham que pagar alojamento, alimentação, e outros custos inerentes aos cursos que frequentam. Em suma, são todos os anos despejados no Litoral milhões de euros provenientes das famílias do Interior, que deste modo têm de pagar para usufruírem de um serviço público que não possuem na sua área de residência.
Note-se que poderíamos enumerar um enorme conjunto de serviços, onde a população do Interior é obrigada a deslocar-se contribuindo para que esses serviços se mantenham abertos no Litoral.
- Na realidade de que o Interior contribui para o enriquecimento do Litoral, uma vez que, as suas populações são obrigadas a migrar para o Litoral, provocando um aumento demográfico, habitacional, emprego, equipamentos sociais, entre outros…
- Na restituição do IP5 para que possamos deslocarmo-nos até Viseu, ou a Aveiro sem portagens, uma vez que, o actual estado de conservação das vias alternativas às SCUTS, torna-as hoje piores do que há 20 ou 30 anos atrás. Note-se ainda a escassez de alternativas ferroviárias.
- Na informação que 80% do traçado da A25 no Distrito da Guarda o limite de velocidade é de 100Km/h, revelando que em termos de segurança rodoviária o troço fica aquém de outros troços da mesma Auto-Estrada e de outras.
Por tudo isto, entendemos merecida a discriminação, exigindo justiça para com as pessoas do Interior, uma justiça só possível com uma discriminação positiva.
Reconheço mérito a Moita Flores, mas também entendo que ninguém é Senhor da Razão e assim a Razão tem que ser repartida.
As razões de ser Beirão só um Beirão as poderá conhecer e, por isso, entendemos bem a discriminação que uma vez mais estamos a ser alvo. Cabe-nos não ficar calados!