terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Qual a saída para toda esta desgraça?

O País ainda não acordou... vive numa profunda letargia que ofusca a realidade...
O início do próximo ano está aí e tudo será diferente, diferente para pior. Tudo será mais caro, as portagens, as taxas moderadoras, a luz, a água, as telecomunicações, os benefícios fiscais, os transportes ditos públicos, em suma tudo será mais caro, em claro contraste com os ordenados.

Torna-se natural perguntar: Qual a saída para toda esta desgraça?

Emigrar é a resposta dada pelos senhores governantes...ao que parece que existe um excesso de portugueses em Portugal.
Não é nenhuma novidade pois há algumas semanas, um secretário de Estado para a Juventude apontava a Emigração como caminho para a Salvação dos estudantes. Agora há poucos dias, o Sr. 1º Ministro disse que os professores desempregados deviam emigrar para os países lusófonos, nos quais encontrariam a felicidade. Até parece que os incentivos à língua Portuguesa é a grande paixão deste governo! Para compor o ramalhete, veio o dr. Telmo Correia, com a sua sabedoria cristã dizendo que este é o caminho, este é o destino.

Pois bem, e os velhos? como escreveu Baptista Bastos, "Que fazer dos velhos que enchem os jardins e a paciência de quem governa? Os velhos não servem para nada, nem sequer para mandar embora, não produzem a não ser chatices, e apenas valem para compor o poema do O'Neill, e só no poema do O'Neill eles saltam para o colo das pessoas. Os velhos arrastam-se pelas ruas, melancólicos, incómodos e inúteis, sentam--se a apanhar o sol; que fazer deles?



Talvez não fosse má ideia o Governo, este Governo embaraçado com a existência de tantos portugueses, e estorvado com a persistência dos velhos em continuar vivos, resolver oferecer-lhes uns comprimidos infalíveis, exactos e letais. Nada que a História não tivesse já feito. Os celtas atiravam os velhos dos penhascos e seguiam em frente, sem remorsos nem pesares. "


Porém existem ainda outros problemas, como a fome e esta é transversal desde os mais novos aos mais velhos. Hoje as escolas, servem de refeitório e de grande ajuda para crianças de barriga vazia. Graças a medidas reformistas do anterior executivo permite que hoje a "escola" seja um albergue de felicidade. A escola tornou-se apetecível para muitas crianças, mais do que nunca é o local em que podemos aprender, aprender e também comer...Alimentar o ego, alimentar a esperança que um dia tudo será diferente, tudo será melhor.

Porém, existem escolas já não têm o que lhes dar. Há cantinas que reabrem, mesmo durante as férias, e sempre se arranja uma carcaça, um leite morno, nada mais, oferecidos por quem dá o pouco que não tem.

Aliada à fome virá mais miséria, mais insegurança, mais violência, mais assaltos, mais vandalismos, mais roubos e uma maior instabilidade social. Como se pôde assistir aos últimos acontecimentos, este foi o mês das greves, foi mês de polémicas entre PSD e PS, foi mês de discussão sobre pontes, feriados e férias, foi o mês da polémica introdução de portagens nas antigas Scut.... Este é o tónico para o virar de ciclo, para o virar de rumo, para o aumentar de muitas dores de cabeça para os portugueses...

São muitos os silêncios que não auguram nada de bom para os próximos tempos e como escreveu há dias uma professora no facebook uma carta ao Senhor primeiro-ministro, em que dizia:" vou poupá-lo a mais pormenores sobre a minha vida. Tenho a dizer-lhe o seguinte: faço hoje 42 anos. Sou doutoranda e investigadora da Universidade do Minho. Os meus pais, que deviam estar a reformar-se, depois de uma vida dedicada à investigação, ao ensino, ao crescimento deste país e das suas filhas e netos, os meus pais, que deviam estar a comprar uma casinha na praia para conhecerem algum descanso e descontracção, continuam a trabalhar e estão a assegurar aos meus filhos aquilo que eu não posso. Material escolar. Roupa. Sapatos. Dinheiro de bolso. Lazeres. Actividades extra-escolares.

Quanto a mim, tenho actualmente como ordenado fixo 405 euros X 7 meses por ano. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. A universidade na qual lecciono há 16 anos conseguiu mais uma vez reduzir-me o ordenado. Todo o trabalho que arranjo é extra e a recibos verdes. Não sou independente, senhor primeiro-ministro. Sempre que tenho extras tenho de contar com apoios familiares para que os meus filhos não fiquem sozinhos em casa. Tenho uma dívida de mais de cinco anos à Segurança Social que, por sua vez, deveria ter fornecido um dossier ao Tribunal de Família e Menores há mais de três a fim que os meus filhos possam receber a pensão de alimentos a que têm direito pois sou mãe solteira. Até hoje, não o fez.

Tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: nunca fui administradora de coisa nenhuma e o salário mais elevado que auferi até hoje não chegava aos mil euros. Isto foi ainda no tempo dos escudos, na altura em que eu enchia o depósito do meu Renault Clio com cinco contos e ia jantar fora e acampar todos os fins-de-semana. Talvez isso fosse viver acima das minhas possibilidades. Talvez as duas viagens que fiz a Cabo-Verde e ao Brasil e que paguei com o dinheiro que ganhei com o meu trabalho tivessem sido luxos. Talvez o carro de 12 anos que conduzo e que me custou 2 mil euros a pronto pagamento seja um excesso, mas sabe, senhor primeiro-ministro, por mais que faça e refaça as contas, e por mais que a gasolina teime em aumentar, continua a sair-me mais em conta andar neste carro do que de transportes públicos. Talvez a casa que comprei e que devo ao banco tenha sido uma inconsciência mas na altura saía mais barato do que arrendar uma, sabe, senhor primeiro-ministro. Mesmo assim nunca me passou pela cabeça emigrar…

Mas hoje, senhor primeiro-ministro, hoje passa. Hoje faço 42 anos e tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: Tenho mais habilitações literárias que o senhor. Tenho mais experiência profissional que o senhor. Escrevo e falo português melhor do que o senhor. Falo inglês melhor que o senhor. Francês então nem se fale. Não falo alemão mas duvido que o senhor fale e também não vejo, sinceramente, a utilidade de saber tal língua. Em compensação falo castelhano melhor do que o senhor. Mas como o senhor é o primeiro-ministro e dá tão bons conselhos aos seus governados, quero pedir-lhe um conselho, apesar de não ter votado em si.

Agora que penso emigrar, que me aconselha a fazer em relação aos meus dois filhos, que nasceram em Portugal e têm cá todas as suas referências? Devo arrancá-los do seu país, separá-los da família, dos amigos, de tudo aquilo que conhecem e amam? E, já agora, que lhes devo dizer? Que devo responder ao meu filho de 14 anos quando me pergunta que caminho seguir nos estudos? Que vale a pena seguir os seus interesses e aptidões, como os meus pais me disseram a mim? Ou que mais vale enveredar já por outra via (já agora diga-me qual, senhor primeiro-ministro) para que não se torne também eleum excedentário no seu próprio país? Ou, ainda, que venha comigo para Angola ou para o Brasil por que ali será com certeza muito mais valorizado e feliz do que no seu país, um país que deveria dar-lhe as melhores condições para crescer pois ele é um dos seus melhores – e cada vez mais raros – valores: um ser humano em formação.

Bom, esta carta que, estou praticamente certa, o senhor não irá ler já vai longa. Quero apenas dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: aos 42 anos já dei muito mais a este país do que o senhor. Já trabalhei mais, esforcei-me mais, lutei mais e não tenho qualquer dúvida de que sofri muito mais. Ganhei, claro, infinitamente menos. Para ser mais exacta o meu IRS do ano passado foi de 4 mil euros. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. No ano passado ganhei 4 mil euros. Deve ser das minhas baixas qualificações. Da minha preguiça. Da minha incapacidade. Do meu excedentarismo. Portanto, é o seguinte, senhor primeiro-ministro: emigre você, senhor primeiro-ministro. E leve consigo os seus ministros. O da mota. O da fala lenta. O que veio do estrangeiro. E o resto da maralha. Leve-os, senhor primeiro-ministro, para longe. Olhe, leve-os para o Deserto do Sahara. Pode ser que os outros dois aprendam alguma coisa sobre acordos de pesca."

Por último, termino prefaciando uma vez mais BB:
"Para que serve este Governo?, a quem favorece, a quem brinda, a quem satisfaz? Podem, em consciência, os seus panegiristas passar ao lado das infâmias a que assistimos, e continuar omissos ou desbragadamente cortesãos? Podem. É ao que temos vindo a assistir. O Governo administra o ódio e o desprezo com a indiferença gélida de quem não é por nós. Diz-se que o anterior Executivo vivia da e na mentira. Este subsiste de quê?"

domingo, 18 de dezembro de 2011

O Governo mente e o Interior sente...

Para conhecimento e tratamento informativo o Partido Socialista de Meda apresentou uma Nota Informativa relativa ao pagamento de portagens “O Governo Mente e o Interior Sente”.

O Partido Socialista de Mêda sempre defendeu a isenção das portagens nas A23, A24 e A25. Estas vias poderiam servir de alavancagem para que fosse possível a fixação de empresas e assim possam contrariar a triste sina do êxodo e do estrangulamento das populações do território de uma parte significativa do nosso País.


A discriminação positiva é uma discriminação mais do que justa com as pessoas que resistem em viver no Interior do País e em especial no Distrito da Guarda. O PS Mêda exige justiça com as suas populações pois não usufruímos do investimento de todas aquelas empresas públicas localizadas no litoral que geram emprego mas também divida como o Metro, a Carris e tantas outras para as quais todos os portugueses sem excepção, dos quais fazemos parte, contribuímos com os nossos impostos, de forma a que as mesmas gerem emprego e serviços, dos quais não usufruímos, para que possam melhorar a nossa qualidade de vida.

O PS Mêda apresentou há mais de um ano uma moção na Assembleia Municipal de Mêda em que repudiava qualquer medida que discriminasse, uma vez mais, o nosso concelho, o nosso distrito e a nossa região.
Assim, alertamos que somos um Concelho com baixo rendimento percapita no Distrito e no País. A esta situação alia-se o facto de não sermos contemplados por uma qualquer via estruturante de grandes dimensões, entenda-se auto-estrada, salientamos o IP2, no entanto este eixo não permite que possamos deslocarmo-nos à sede do Distrito sem custos.

Face a esta conjuntura, fomos obrigados acreditar que só poderá ser um engano o facto de quererem que aqueles que nos 37 anos de Democracia não usufruíram de qualquer tipo de infra-estruturas, IP ou AE, sejam os primeiros e quase únicos deste Distrito a ter que pagar portagens na A23 e A25, únicos eixos que nos poderão levar ao desenvolvimento. No entanto, depois de muitas incertezas e introduzidas a cobrança de portagens nas Scut´s no passado dia 8, o PS Mêda pergunta:
Onde estão contempladas as 10 isenções por mês a todos os Medenses que aderiram à dita “Isenção Positiva” e que pretendem deslocar-se à Capital de distrito (cidade da Guarda)?


Porque queremos saber, o porquê de estarem a ser cobradas portagens no pórtico da A25 designado por IP2 Norte e não estão a ser descontadas ou contabilizadas as 10 isenções...

Esta situação é tão caricata que, uma deslocação com a passagem de mais que um pórtico é contabilizada nas 10 isenções mensais e na passagem de apenas um pórtico não permite qualquer isenção.


É caso para se dizer: Fomos enganados, mas não ficaremos parados...

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Os Amigos

Recordar Al Berto (Alberto Raposo Pidwell Tavares), conhecio-o de forma muito fugaz, mas de muito cedo que me fascinou a sua escrita.

...................Os Amigos............................

no regresso encontrei aqueles
que haviam estendido o sedento corpo
sobre infindáveis areias

tinham os gestos lentos das feras amansadas
e o mar iluminava-lhes as máscaras
esculpidas pelo dedo errante da noite

prendiam sóis nos cabelos entrançados
lentamente
moldavam o rosto lívido como um osso
mas estavam vivos quando lhes toquei
depois
a solidão transformou-os de novo em dor
e nenhum quis pernoitar na respiração
do lume

ofereci-lhes mel e ensinei-os a escutar
a flor que murcha no estremecer da luz
levei-os comigo
até onde o perfume insensato de um poema
os transmudou em remota e resignada ausência

De: Al Berto, in 'Sete Poemas do Regresso de Lázaro'

domingo, 4 de dezembro de 2011

A crise está aí!

A crise está aí e mais do que a crise económica é a crise das palavras...todos nos tentamos desculpabilizar pois o estado de pecado no homem não é um facto, senão apenas a interpretação de um facto, a saber: de um mal-estar fisiológico, considerado sob o ponto de vista moral e religioso. O sentir-se alguém «culpado» e «pecador», não prova que na realidade o esteja, como sentir-se alguém bem não prova que na realidade esteja bem...segundo Nietzsche.


A crise deveu-se a muitos factores, erros do passado e do presente, conjunturas complexas e imprevisiveis, uns apontam que o maior factor desta crise se deve ao comércio externo, terá sido a produção de bens, a falta de inovação, a emigração, foi a imigração, resultados de uma civilego necessária para assegurar o estado social, a fuga a fundos, a fuga ao fisco, um aumento da economia paralela, o aumento da corrupção, foram as off-shores, foi a especulação financeira, será o darwinismo no mundo financeiro, a bolha imobiliária, a falta de crédito...


Os Portugueses apontam vários responsáveis no entanto, a guerra entre o público e o privado já começou, espero que as reporcussões não sejam maiores mas os próximos tempos tudo entrará em reboliço e seja de quem for a culpa, esta não poderá morrer solteira. Enquanto esperamos que o tempo se encarregue de julgar, deixo dois pontos de vista. Dois artigos, o primeiro da autoria de Henrique Raposo (Jornal Expresso) e o segundo de Pedro Santos Guerreiro (Jornal de Negócios).
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“Caro funcionário da República, hoje sou apenas o portador de uma mensagem do meu primo (sim, as bestas reacionárias também têm primos). O meu primo trabalha numa empresa que, como tantas outras, enfrenta imensas dificuldades. A hipótese da falência deixou de ser uma coisa longínqua e, por arrastamento, o desemprego passou a ser um cenário possível. E é assim há muito tempo. Há muito tempo que este pesadelo está ali ao virar da esquina. Portanto, a mensagem do meu primo começa assim: V. Exa. está disponível para trocar o seu vínculo-vitalício-ao-Estado por um contrato-ameaçado-pela-falência-e-pelo-desemprego? Quer trocar 12 meses certíssimos por 14 meses incertos?

Depois, o meu primo gostava de compreender uma coisa. Se a empresa dele fechar, ele cairá no desemprego e terá de procurar emprego novo. Mas se a repartição pública de V. Exa. fechar, o meu caro funcionário da República irá para o "quadro de excedentários". Por que razão V. Exa. tem direito a esta rede de segurança que mais ninguém tem? Porquê? Em anexo, o meu primo gostava de propor outra troca: V. Exa. está disponível para trocar a ADSE pelo SNS? Sim, porque o meu primo tem de ir aos serviços públicos (SNS), mas V. Exa. pode ir a clínicas e hospitais privados através da ADSE. Quer trocar? E, depois de pensar na ADSE, V. Exa. devia pensar noutro pormenor: a taxa de absentismo de V. Exa. é seis vezes superior à das empresas normais, como aquela do meu primo. E, ainda por cima, o meu primo não tem uma cantina com almoços a 3 euros, nem promoções automáticas. Mas vai ter de trabalhar mais meia-hora por dia.

Para terminar, o meu primo está muito curioso sobre uma coisa: das milhares e milhares de famílias que deixaram de pagar a prestação da casa ao banco, quantas pertencem a funcionários públicos? Quantas? Eu aposto que são pouquíssimas. Portanto, eu e o meu primo voltamos a colocar a questão inicial: V. Exa. quer trocar? V. Exa. quer vir trabalhar para uma empresa real da economia real que pode realmente entrar em falência e atirar os empregados para a realidade do desemprego? V. Exa. quer trocar a síndrome do funcionário público pela síndrome do desemprego?”
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Missionários públicos
“Dava 24% do seu salário em troca da segurança de emprego vitalício? Muitos funcionários públicos deram, mesmo que ninguém lhe tenha perguntado nada. Com os pensionistas, pior: ninguém lhes ouve sequer um pio. A decisão poupa milhões. Mas sendo uma medida com muito corpo, ela não tem pés nem cabeça. Acha mesmo que "é bem feita"?... Que é assim que se reestrutura o Estado? Muitos acham. Há uma colectividade numerosa que defende estes cortes com base em dois argumentos: o de que os funcionários públicos têm segurança no trabalho; e que ganham mais do que o sector privado. Esta raiva contra a Função Pública é já um sintoma de cisão social. Mas está assente em várias falácias. Os trabalhadores com contrato de função pública têm segurança do trabalho (apetece dizer: por enquanto). Mas estes cortes afectam muitos outros que a não têm: os funcionários das empresas públicas, de empresas municipais e de institutos que venham a ser extintos, se tiverem contrato individual de trabalho. Mas a principal falácia é outra: a de que os funcionários públicos ganham mais. Isso é verdade... em média.

Segundo estudos do Banco de Portugal, os funcionários públicos auferem entre 10% e 20% de remuneração superior à iniciativa privada. No entanto, são os que estão nas funções de baixas qualificações que ganham mais, o que se inverte ao longo da hierarquia. Ou seja, quanto "pior" se é, mais se ganha face às empresas; quanto "melhor" se é, pior se ganha comparando com a iniciativa privada. Esta disfunção salarial é conhecida e não é resolvida, antes agravada, por este corte de salários cego. Quem mais ganha terá um corte superior a quem menos ganha, o que sendo socialmente justo, alarga o fosso face à iniciativa privada. O incentivo para sair da Função Pública (ou para baixar os braços) é agora grande e aqueles que o poderão fazer são os melhores.


Há quem ache que são todos malandros e portanto é correr com eles. Essa sanha é míope: a desvalorização da Função Pública tem sido um pecado contra o Estado quase tão grande quanto foi a engorda do número dos seus quadros. O problema da Função Pública é ser grande demais para o que faz (ou produzir de menos para a dimensão que tem), estar muitíssimo mal chefiada, mal distribuída e enfeudada. Seria estrategicamente melhor para o Estado ter feito um despedimento do que este corte cego. Os custos sociais, no entanto, seriam impraticáveis, tendo em conta o desemprego. Ver tanta gente a exultar com esta navalhada é inquietante. Como o é ver que ninguém parece querer falar dos pensionistas, a quem também se retiram 14% das pensões dos próximos dois anos. Talvez seja porque os pensionistas não tenham sindicato... Mas não duvide: o Estado está a falhar num contrato que assinou. E se o Governo diz que 80% dos pensionistas não serão afectados, isso só significa que 80% das pensões são baixas. O Governo ainda não explicou as contas para um corte tão profundo. O desvio do défice do primeiro semestre explica muito mas não tudo. Parece claro que o corte prometido da despesa intermédia está a falhar, e que a reforma do Estado avança como um caracol. E que, portanto, Vítor Gaspar pôs cinto e suspensórios: cortou salários e pensões, que é a forma mais segura de garantir corte de despesa. Vítor Gaspar faz bem em assegurar o cumprimento das metas mas isso não pode significar a desistência do que Pedro Passos Coelho prometeu e ainda não fez.


E, já agora, se o primeiro-ministro está tão cismado em encontrar os responsáveis políticos do desmando actual, devia actuar junto do mesmo sistema que o fez e fará medrar: o político. O financiamento partidário. O número de deputados. A reforma administrativa, que tem de ir mais longe. Não havia alternativa a medidas com este alcance. Mas havia outras medidas possíveis. Teria sido melhor um imposto extraordinário sobre todos os rendimentos e sobre todo o património. É polémico, claro, mas não menos do que cortar salários à Função Pública. O Governo, que está refém da sua própria pressão de cortar despesa, optou por um caminho que corre o risco da demagogia. O Estado não está a reestruturar a Função Pública, está a aniquilá-la.


O país, no estado que está, precisa da "boa" administração do Estado e é esta que está a enxotar. Arrisca-se a ficar apenas com a "má", que é a comparativamente cara e improdutiva. A todos pede agora compaixão: que apesar de tirar quatro salários dos próximos 48, seja missionário. A salvação do Estado deixou, pois, de ser uma questão de governação. Passou a ser uma questão de fé. Que a fé nos proteja.”