segunda-feira, 2 de novembro de 2009

António Sérgio, até sempre...

As melodias e sonoridades que, ao longo das últimas décadas, nos foram dadas a ouvir por António Sérgio nos seus programas de rádio, fizeram do locutor um caso ímpar da esfera radiofónica portuguesa.
A sua voz eloquente, rouca e com uma extraordinária colocação, fizeram dele um caso único, nas escolhas e nas novidades sonoras que fizeram de António Sérgio um ícone das últimas décadas pela marca que imprimiu às escolhas musicais de várias Gerações.
Na Comercial e mais recentemente na Radar, ouvi nos seus programas sonoridades que marcam as minhas escolhas e definiram o meu gosto musical.
Ao longo da década de 90, aprendi a gostar de Grunge e bandas como Dinossauro Jr., Pearl Jam, Nirvana, Soundgarden, Stone Temple Pilots, L7, Hole, entre outras. Ao longo desta década de 90, aprendi a gostar de outras sonoridades, de Bristol vieram outras bandas para os nossos ouvidos, desde Portishead, Massive Attack, Goldfrapp, Air, Hooverphonic, Kid Loco, Gus Gus, Jay-Jay Johanson, Gotan Project, DJ Shadow, Moloko Lamb, Moloko, Zero 7, entre muitas.
Ao longo desta última década, António Sérgio passou nos seus programas belas sonoridades, novas tendências conjugadas à electrónica e seus derivados, proporcionando uma sonância colorida e independente a todos os seus ouvintes.
António Sérgio era uma margem de certa maneira, uma margem que marcava a diferença, a diferença de um locutor capaz de se adequar aos novos tempos, ao longo de muitos anos. No fundo, ele era impulsionador de novas tendências, de novos ritmos e de novas gerações, ele dava-nos a ouvir o som da frente, da vanguarda, da independência e da alternativa, conjugava o mistério da novidade com o que de melhor se fez ao longo das últimas décadas, fazia respeitar o antes, projectando os sons do amanhã.
Enfim, António Sérgio era o “lobo radiofónico” e o seu timbre fazia-o “único”.
Não sei se o António sabia cantar, mas o seu vozeirão era excepcional e por isso deixem-me apelidá-lo do Tom Waits da Rádio Portuguesa.

Este dia, marca o fim de um ídolo de muitos, que com ele aprenderam a ouvir e a seguir grandes bandas e músicos que marcaram diferentes gerações.
Um Abraço para todos aqueles que ouviram ao longo de anos os seus programas, um deles o meu amigo Tó Sampaio.
Para o António Sérgio, até sempre…

domingo, 25 de outubro de 2009

As fraquezas da nossa Democracia...



A tentação de não pecar ou melhor, a tentação de não desagradar à oposição levou Sócrates à impulso de nomear ministros independentes, possuidores de um conhecimento técnico e operacional, mas também discretos do ponto de vista das elites sociais.
Porém não se escusou de nomear, para sua esfera nuclear e de proximidade, alguns nomes previsíveis e que denotam continuidade na sua saga reformista.
Teixeira dos Santos, Luís Amado, Pedro Silva Pereira e Vieira da Silva são nomes mais do que previsíveis, desejáveis dada a sua importância no aparelho partidário do PS. Note-se que, neste seio, o afastamento de Augusto Santos Silva e a não promoção de Jorge Lacão podiam causar danos internos e a implosão poderá ainda acontecer se Ascenso Simões e Luís Patrão, entre outros, próximos de Sócrates não forem nomeados para gerir algumas das mais importantes Secretarias de Estado.
Aquando da constituição de um Governo, as tentações são sempre muitas... Serão talvez menores quando as maiorias relativas não permitirem o olhar atento de não hostilizar em demasia a oposição.
Por isso, foi importante afastar os Ministros que mais impopularidade suscitaram em determinados sectores sociais e profissionais.
Este posicionamento foi uma variável necessária para que ecluda, nos próximos tempos, algum estado de graça e assim, a apresentação do programa de governo e o próximo orçamento de estado possam passar, sem grande contestação ou com a abstenção necessária às suas aprovações. Questões estas não falíveis apenas para o Governo, existe de igual modo, uma responsabilidade acrescida para os partidos da oposição. Mas a história nem sempre se repete. Comparar o actual sistema político Português e contextualizá-lo com o que vigorou, há mais de 22 anos atrás, é um exercício anacrónico, extemporâneo, o risco e a resposta dada em 1987 pelos Portugueses não será porém de descartar enquanto solução a uma oposição irresponsável.
Os Portugueses fartaram-se de eleições e o que mais precisam é de respostas efectivas aos problemas do seu quotidiano. O desemprego é a gigante preocupação, pela sua intrínseca ligação à economia.
Os Portugueses não entendem que a economia pode crescer com o emprego a diminuir, como exemplo do nosso país vizinho, no decorrer dos governos de Felipe Gonzáles isso aconteceu. Pode servir de exemplo mas não de antídoto para as dificuldades das nossas famílias.

Julgo que a imaginação conjugada com determinação, pode ser importante na superação desta crise económica e social. A continuidade de Ana Jorge, Rui Pereira ou mesmo Mariano Gago são garantia de uma menor adversidade à impopularidade. Neste neófito governo a paridade não será também manchete de discussão, o que vem acrescentar créditos na popularidade do mesmo. Realce-se que este governo com mais mulheres, aproxima-nos da norma europeia, no entanto afasta-nos com um número acrescido de ministros independentes. Como escreveu Pedro Adão e Silva, ao Jornal I « É verdade que a entrada de novos ministros, recrutados fora da esfera partidária e governativa, revela capacidade de atracção, quando se temia que ela já não existisse. Mas, acima de tudo, esconde um conjunto de fragilidades do sistema partidário português. Fragilidades que, em lugar de serem contrariadas, são reforçadas. Os independentes tendem a revelar-se, com excepções, casos problemáticos de inabilidade política (risco que é maior quando não há maioria absoluta). Mas são essencialmente um sintoma de fraca institucionalização dos nossos partidos. Nas democracias do Norte da Europa há poucos ministros vindos de “fora” do sistema partidário: ou são previamente eleitos para o parlamento ou são “ políticos profissionais”, saídos dos aparelhos partidários ou sindicais.
Num caso e noutro, há incentivos para os melhores irem a votos e, o que não é menos importante, para se envolverem na vida política. Em Portugal temos sistematicamente o incentivo contrário. A mensagem é clara: "Se ambicionas ser governante, afasta-te dos partidos." Esta mensagem tem várias consequências - degrada (ainda mais) a imagem dos partidos e secundariza o seu papel na configuração da governação, ao mesmo tempo que tenta resolver pela porta do cavalo a sua fraca ancoragem social. Se calhar, as quotas de que precisamos são as que obrigam os ministros a serem eleitos em listas partidárias.»


Com este novo Governo, surge a dúvida ao nível de conflitualidade, que será emergente entre o poder e o contra-poder. E eis que surgem as dúvidas: Sócrates será capaz de esconder dentro de si o animal feroz e a austeridade de governar? Não cairá na tentação de ceder a alguns lobbies que afrontou no Governo anterior? Continuará este primeiro-ministro a preferir quebrar do que torcer? Sócrates terá já cogitado das dificuldades parlamentares, certo de uma oposição que vai querer Governar sem assumir responsabilidades...?
A capacidade de saber governar e o tempo que durará este Governo estará dependente da astucia política de Sócrates e dos seus ministros, para impossibilitarem a Oposição a governar a partir do Parlamento. Por isso, o destino dos socialistas e o dos partidos da Oposição será traçado em eleições e aí o que mais contará será o estado da economia. A economia será o factor determinante da Governação, se a crise for superada de pouco valerá à oposição lamentar-se, Sócrates será o grande vencedor.
Aguardemos pelos próximos capítulos, das fraquezas da nossa democracia...


quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Uma Escola...

Por vezes, somos surpreendidos com raciocínios de bastante interesse de autores que não temos a maior das admirações e por quem presumivelmente não tem um conhecimento específico sobre o assunto tratado. Neste caso, é um texto de António José Seguro sobre o tema “ A Escola Ideal”, não é um texto que transmita algo de concreto que se possa concretizar no presente, um novo paradigma mas sim, uma ilusão, uma utopia futurista que norteia e que aguce um desafio constante e permanente.
Será sempre difícil para um político poder desligar-se dos mecanismos e automatismos que a mesma nos obriga. A visão de um pedagogo, é sempre um desafio diferente e terá uma perspectiva mais naturalista, contudo rendo-me ao texto de António José Seguro, porque não deixa de ser uma visão da qual tem um interesse na defesa de uma escola de todos e para todos, com a quimera necessária de que um dia a escola seja como Comenius a projectou “Ensinar tudo a todos”.

Cito:
Na escola ideal para os meus filhos “todos são filhos e não háenteados”. Todas as crianças são tratadas pelo seu nome. Há meninos emeninas de várias culturas e nacionalidades. As origens e os percursosde vida são conhecidos e partilhados. A diferença é cultivada evalorizada como uma riqueza da Humanidade. A diferença suscita acuriosidade, o interesse e o respeito. Ser diferente soma e une.Na escola os professores são referências. Pela sua visão do mundo,pelo que sabem, pela forma como transmitem o conhecimento, pela suadisponibilidade e pela sua dedicação, exclusiva, a ensinar a aprender.
Os professores são pessoas felizes e realizadas. São amigos.Na escola ideal ensina-se a aprender e a ter gosto em continuar aaprender ao longo da vida, dando expressão à ideia de Agostinho da Silva que a escola deve ser um local onde eu possa ir 24 horas pordia, 365 dias no ano, perguntar tudo o que não sei e poder conversarcom todas as outras pessoas que vão fazer o mesmo que eu.Na escola ideal não há apenas alunos e professores. Há pais e toda umaaldeia, uma vila ou uma cidade necessária para a educação de cada umadas crianças. Há professores e profissionais especializados.
Nesta escola não há muros nem grades divisórias. É integralmenteconstruída em paredes de vidro - bem no centro da cidade.
A escola é o coração do espaço público e os seus jardins e espaços verdesconfundem-se com a envolvente urbana. As vias pedonais atravessam aescola e o campo de recreio é visível por todos. Nesta escola aeducação cívica não substitui a educação devida pelos pais mascomplementa-a na busca de uma sociedade mais solidária. Não há temas tabus e a educação sexual é encarada com naturalidade.
Os comportamentos violentos, de discriminação e de bullying são abordadose discutidos por todos e a inclusão é explicada como forma de vida. Não se escondem as desigualdades sociais e explica-se abertamente porque razões existem e de que forma podemos corrigi-las. A escola ideal não reproduz a sociedade. Puxa pela sociedade. Vai à frente.Na escola ideal há livros que não param de chegar e que se juntam aosclássicos. Apreende-se a História do meu país e a Universal. Desenvolve-se a compreensão. Aprendem-se línguas. A língua portuguesaem primeiro lugar. Estimula-se o raciocínio, a criatividade e aimaginação.
As crianças não abandonam a escola sem saberem ler,escrever, contar e falar. A escola prepara para a vida. Para o mercadode trabalho, mas também a ser Homens e Mulheres. Profissionais empreendedores, competentes e cidadãos responsáveis.Uma escola exigente, com igualdade de oportunidades para todos, quenão deixe ninguém para trás e que garanta condições de afirmaçãoindividual das competências de cada aluno.Uma escola com tempo para aprender, para praticar desporto, brincar econviver. Uma escola que promove as ideias e incentiva a critica. Que ensina a utilizar as novas tecnologias e nos envolve no mundo dasartes. Onde se aprenda que o ser é mais importante que o ter.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Coincidência ou Semelhança?



Coincidência ou Semelhança?

Exercício:

Substitua as palavras: Manuela Ferreira Leite por João Mourato e a palavra Madeira por Meda; e certamente encontrará algo de semelhante!




quarta-feira, 29 de julho de 2009

Sócrates e Aquiles…

A política de Sócrates falha essencialmente no excesso da política de Guterres, o Diálogo.

Se Sócrates não fosse assaz arrogante e conseguisse explicar com alguma humildade aos Portugueses as suas reformas, de modo a que estes as entendessem, estaríamos certamente próximos de uma nova maioria absoluta.

Vejamos, como exemplo, esta última medida apresentada no programa eleitoral para as próximas legislativas, que consiste na promessa de uma “conta futuro“ de 200 euros por cada bebé que nasça. A informação, hoje avançada pelo porta-voz João Tiago Silveira, revela que o dinheiro será depositado em nome do bebé, podendo ser levantado quando o titular completar 18 anos.

Entretanto, até essa data, os pais poderão reforçar a conta, através de deduções fiscais, em muito semelhantes às estabelecidas para as contas Poupança Reforma.

Ora aqui está uma bela medida mas que tem o seguinte ónus, o porquê só agora, levando-nos a questionar porque não foi esta executada ao longo da legislatura ainda em vigor. Tal como inúmeras outras, para os Portugueses, em geral, esta iniciativa é vista como uma mera promessa eleitoral.

Sócrates perdeu, ou melhor não foi capaz de dialogar com o País ao longo destes 4 anos, colocando-se agora a seguinte dúvida:

Será que os portugueses estão interessados em ouvi-lo?

Mais do que socialista sou esquerdista, razão pela qual sou obrigado a reconhecer a capacidade reformista de Sócrates, o que faz de mim um defensor asserido das suas medidas. Não obstante, não partilho da forma como implementou as mesmas.

Sócrates é o primeiro-ministro que o país precisou, precisa e precisará para sair desta crise nacional e global, mas o seu problema comunicacional torna-se o seu “calcanhar de Aquiles ou língua de Aquiles” enquanto espera por uma resposta eleitoral.

O país precisa de uma informação bilateral, e os feedback são de suma importância para reconduzir Sócrates ao lugar de primeiro-ministro.

sábado, 11 de julho de 2009

É URGENTE REPENSAR...


É urgente repensar, inflectir, para que se não cometa uma das maiores atrocidades paisagísticas no Douro Vinhateiro, com atenção particular ao ancião Vale da Veiga de Longroiva, junto à ribeira de Piscos.

« Esta planura ocupa o extenso "graben" que ali se formou. Durante mais de dois milénios aquele espaço foi destinado essencialmente ao pastoreio, mantendo um extenso baldio junto da ribeira. A partir de meados do século XIX tornou-se uma zona rica de vinhedos e de olivais, após a arrematação ou a ocupação abusiva dos baldios por parte de alguns senhorios. Quase no extremo norte do vale mantém-se ainda um testemunho do aproveitamento agro-pecuário, que a Ordem de Cristo aqui fez, conservado no nome da "Quinta do Chão de Ordem"».


A conclusão da construção do IP 2, que finalmente ligará as duas capitais de distrito Guarda e Bragança é, sem dúvida, uma via estruturante ao desenvolvimento destas regiões. No entanto, é importante repensar e inflectir sobre o que parece estruturante e vital, que no futuro se poderá revelar fatídico tornando-se numa “betãonizada”, afectando um dos vectores importantíssimos da região, o Turismo e o desenvolvimento agrícola.

A sua riqueza paisagística e todo o património envolvente, ficará atolado com a construção deste traçado rodoviário.

Reparamos já que houve alterações ao traçado inicial, tendo certamente funcionado influências como é prova o desvio à Quinta do Vale Meão.

Não vou incentivar desconfiança entre como e quem está adjudicar e concessionar os terrenos... Porém os interesses em cumprir prazos e a excessiva celeridade é, por vezes, um péssimo indicador e precipita a ignorância. Celeridade não é sinónimo de rigor, desconhecem-se os estudos efectuados, sobre o seu impacto ambiental, paisagístico, arqueológico, patrimonial...e quais os critérios impostos que levaram a este atropelo feroz e que certamente irão culminar na destruição de um dos mais belos lugares da nossa Região.

Infelizmente é impossível ver alguns Durienses, que já não habitam entre os mortais (Aquilino Ribeiro ou Miguel Torga ), levantarem-se contra este atentado certamente com a astucia de quem melhor sabe expressar o demais evidente, obrigando os agentes políticos envolvidos a repensar a atrocidade que estão a cometer.

Hoje, 11 de Julho, no salão nobre da Câmara Municipal de Mêda, o Secretário de Estado das Obras Públicas (Dr. Paulo Campos) e o Presidente da Câmara Municipal de Mêda (Dr. João Mourato) assinam provavelmente o atestado de óbito do Vale da Veiga.

Mais uma vez, o Sr. João Mourato nada faz, nada fez para impedir este traçado do IP 2. Este ficará certamente na história como um dos responsáveis por este assassinato, marcando-a como um inerte que nada faz para o bem do concelho da Mêda.

Assumo que este desabafo poderá ser tardio, mas como diz o povo: “Vale mais tarde do que nunca...” e denunciar o erro, tentando que este não se torne uma realidade irreparável e irremediável .

sexta-feira, 10 de julho de 2009

25 de Abril... Sempre.


Estou decidido a escrever com maior regularidade, aproveito para expor a minha intervenção na sessão solene da Câmara Municipal de Mêda, relativa às comemorações do 25 de Abril.

Por incrível que pareça este ano o edil do município resolveu dar um ar de Homem de Abril, até cravo envergou na lapela.. Que Maria Madalena, tão arrependida... ele está.

Porque Será? Do Guaraná? Ou do vinho, da já extinta Adega Cooperativa da Mêda??

Ou pesa-lhe já a Consciência do mal que tem causado...e da perseguição que faz constantemente aqueles que não partilham das suas convicções...

O Mourato é uma espécie de iogurte fora do prazo....

( além de não ter sabor, já é um perigo para a saúde pública do nosso concelho.)

Aqui deixo a transcrição da minha intervenção relativa ao 25 de Abril.



25 de Abril, Sempre…

Começo este meu intrometimento, fazendo uma breve resenha de um tempo anterior ao 25 de Abril de 1974, o antes da Revolução, nada melhor que recordar o inicio de um dos belos poemas do célebre saudoso José Carlos Ary dos Santos - “As Portas que Abril Abriu”- que caracteriza um Portugal, como

Um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra

Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza

Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raíz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado

Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos dos passado
se chamava esse país
Portugal suicidado

Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra

Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos


E poderia continuar com este poema para representar o país cinzento, empobrecido, atrasado, oprimido, coagido à tirania do fascismo e o censuricidio como prática constante.

Assim, o 25 de Abril amanheceu com tonalidades de coragem e determinação, no movimento conduzido pelos oficiais intermédios da hierarquia militar (o MFA), na sua maioria capitães com experiência na Guerra Colonial, iniciou-se a
Revolução dos Cravos, nome pelo qual se popularizou o golpe de estado militar que derrubou, num só dia, sem grande resistência das forças leais ao governo de Marcelo Caetano, que cederam perante a revolta das forças armadas, pondo fim ao regime político que vigorava em Portugal desde 1926.

Ao longo desta operação foram dados sinais de revolta, a desopressão era inevitável a revolução estava na rua, homens, mulheres, novos e velhos acreditavam num país novo.

Nesta manhã de Abril, floriu a esperança de uma nação livre, livre de opressões, livre de guerra, livre de espírito, livre no sentir, livre de dogmas, livre nos direitos humanos e livre para construir uma democracia.

Foi com a revolução de Abril que os partidos deixaram a clandestinidade, os mais pequenos partidos puderam ambicionar ser maiores. Aqueles que outrora foram opositores seriam um dia poder.

Foi com a revolução de Abril que o poder local ganhou autonomia, que o poder local se modernizou e dinamizou políticas mais próximas das pessoas.

O país encheu-se de coragem e de esperança, porém nem tudo foi fácil, perigos como o Comunismo espreitavam esta neófita democracia comparada com a de outros países, no entanto foi suficientemente inspiradora a Revolução de Abril, tendo sido a menos sangrenta que ainda hoje é exemplo para o mundo.

Esta revolução serviu de nascente para o poder institucional e a génese da nossa Constituição.

Estes 35 anos de Democracia não são a meta mas sim o caminho que continuamos a percorrer na consolidação de uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais livre.
No campo ideológico vive-se uma dinâmica globalizante de transformação diária. O mundo é hoje global e as exigências mudaram os paradigmas são outros e a atenção de todos é imperiosa para dar resposta às necessidades sociais de forma a combater as discriminações ainda existentes.

A participação cívica é hoje mais do que nunca obrigatória, a criação de novos movimentos cívicos são o baluarte e a garantia que Abril não acabou. O país está diferente, melhor na educação, melhor na saúde, melhor em muitas outras áreas vitais para a vanguarda de um país moderno e adaptado aos novos desafios.

Hoje 35 anos depois da revolução de Abril, o país está diferente, somos mais 2 milhões de portugueses. É um facto que as famílias têm menos filhos, hoje vive-se mais tempo e a chegada de novas culturas tornou-nos mais cosmopolitas, mais universais. Só com esta riqueza cultural é que poderemos voltar a estar na linha da frente, só assim os vários saberes poderão tornar-nos mais ambiciosos na ciência e na investigação. O mito Salazarista do “orgulhosamente sós”, há muito que não faz sentido, hoje somos Europeístas e não estamos num bunker isolados do mundo.

Contudo, não podemos anunciar que não existam perigos e que tudo está feito, é necessário agir, há outras preocupações, emergem novos perigos para a liberdade individual e colectiva, mecanismos ferozes e demolidores que podem ser nefastos para actual sociedade.

Paul Legrand ensinou que a educação é permanente, pois só assim a democracia é eficaz, os perigos das novas tecnologias quando se submetem à perversidade humana em vez do interesse social, podem desencadear o fracasso global. A sociedade necessita do seu próprio auto-controlo, precisa de se auto-regular. Esta auto-regulação não pode ser confundida com um sistema de controlo que debilite a democracia, porque se ocorrer uma deriva totalitária instrumentalizada nas mãos dos mais poderosos, a regressão ao passado é um pequeno passo. Não se pode permitir que a liberdade individual possa estar em perigo, não podemos aceitar que sejamos controlados electrónica e ideologicamente, e se aceite que toda a nossa vida seja reconstruída por outros e não por nós. A participação cívica de todos é mais uma vez um dos grandes desafios que temos pela frente, como disse há poucos dias o general Ramalho Eanes «É tempo de mudarmos porque já não temos tempo para continuar a ter medo. É tempo de mudarmos porque as linhas de futuro que levam ao futuro que desejamos são nós e mais ninguém que as pode abrir».

Se Abril abriu portas, estas jamais poderão ser fechadas. Os políticos têm de ser responsáveis porque são os actores das decisões e não podem construir um futuro que possa hipotecar gerações.

Por último e falando de nós, interior deste país, dois terços do nosso território, a vitimização da interioridade não pode servir de álibi para os responsáveis autárquicos que estrangularam e hipotecaram concelhos que hoje estão no caminho do definhamento destes municípios, a pouca inspiração e o comodismo instalado são hoje a maior preocupação do país.

Durante muitos anos tem se assistido ao mesmo discurso por parte de autarcas e políticos da nossa praça, que dizem: Somos interior ajudem-nos, combatamos as assimetrias, estamos esquecidos… Tem sido sobre esta batuta que os discursos se têm moldado, com mais algum tempero de malignidade e assim se fomenta a cegueira há muito instalada. Encontrem-se fórmulas, estratégias, ideias que possam contrariar este triste estrangulamento.

Por último e por surpreendente que pareça quero congratular a Autarquia da Mêda por finalmente e provavelmente a última sede de concelho deste país a colocar um nome de uma rua em comemoração à Revolução de Abril.

Que o sentido de Abril seja finalmente concretizado no nosso município muito em breve.

Termino, com palavras de Manuel Alegre:

Foram dias foram anos a esperar por um só dia.
Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía
com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia
na esperança de um só dia.

Viva o 25 de Abril, Sempre.


sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

SONETO ANTI COLONIALISTA de Joaquim Pessoa

SONETO ANTI COLONIALISTA

Ah Diogo! Ah Cão! Em que deZaire
pretendes colocar o teu padrão?
El-rei morreu. As naus de clarear
são agora de um povo nosso irmão.

Dispensámos as balas e os escravos
e mais para diante navegámos.
Negreiros não. Dissemos sim aos cravos.
O mar não dói. E a terra não tem amos.

Ah Diogo! Ah Cão! Que resultado
esperavas deste povo a ver morrer
o seu corpo na farda de soldado?

Esta Nau do futuro há-de vencer!
Mas há cães que só ladram o passado
porque o presente é duro de roer!


Joaquim Pessoa

-A propósito de uma reportagem passada no canal 1, ontem à noite, sobre a (des)colonização...