sexta-feira, 10 de julho de 2009

25 de Abril... Sempre.


Estou decidido a escrever com maior regularidade, aproveito para expor a minha intervenção na sessão solene da Câmara Municipal de Mêda, relativa às comemorações do 25 de Abril.

Por incrível que pareça este ano o edil do município resolveu dar um ar de Homem de Abril, até cravo envergou na lapela.. Que Maria Madalena, tão arrependida... ele está.

Porque Será? Do Guaraná? Ou do vinho, da já extinta Adega Cooperativa da Mêda??

Ou pesa-lhe já a Consciência do mal que tem causado...e da perseguição que faz constantemente aqueles que não partilham das suas convicções...

O Mourato é uma espécie de iogurte fora do prazo....

( além de não ter sabor, já é um perigo para a saúde pública do nosso concelho.)

Aqui deixo a transcrição da minha intervenção relativa ao 25 de Abril.



25 de Abril, Sempre…

Começo este meu intrometimento, fazendo uma breve resenha de um tempo anterior ao 25 de Abril de 1974, o antes da Revolução, nada melhor que recordar o inicio de um dos belos poemas do célebre saudoso José Carlos Ary dos Santos - “As Portas que Abril Abriu”- que caracteriza um Portugal, como

Um país
onde entre o mar e a guerra
vivia o mais infeliz
dos povos à beira-terra

Onde entre vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
um povo se debruçava
como um vime de tristeza
sobre um rio onde mirava
a sua própria pobreza

Era uma vez um país
onde o pão era contado
onde quem tinha a raíz
tinha o fruto arrecadado
onde quem tinha o dinheiro
tinha o operário algemado
onde suava o ceifeiro
que dormia com o gado
onde tossia o mineiro
em Aljustrel ajustado
onde morria primeiro
quem nascia desgraçado

Era uma vez um país
de tal maneira explorado
pelos consórcios fabris
pelo mando acumulado
pelas ideias nazis
pelo dinheiro estragado
pelo dobrar da cerviz
pelo trabalho amarrado
que até hoje já se diz
que nos tempos dos passado
se chamava esse país
Portugal suicidado

Ali nas vinhas sobredos
vales socalcos searas
serras atalhos veredas
lezírias e praias claras
vivia um povo tão pobre
que partia para a guerra
para encher quem estava podre
de comer a sua terra

Um povo que era levado
para Angola nos porões
um povo que era tratado
como a arma dos patrões
um povo que era obrigado
a matar por suas mãos
sem saber que um bom soldado
nunca fere os seus irmãos


E poderia continuar com este poema para representar o país cinzento, empobrecido, atrasado, oprimido, coagido à tirania do fascismo e o censuricidio como prática constante.

Assim, o 25 de Abril amanheceu com tonalidades de coragem e determinação, no movimento conduzido pelos oficiais intermédios da hierarquia militar (o MFA), na sua maioria capitães com experiência na Guerra Colonial, iniciou-se a
Revolução dos Cravos, nome pelo qual se popularizou o golpe de estado militar que derrubou, num só dia, sem grande resistência das forças leais ao governo de Marcelo Caetano, que cederam perante a revolta das forças armadas, pondo fim ao regime político que vigorava em Portugal desde 1926.

Ao longo desta operação foram dados sinais de revolta, a desopressão era inevitável a revolução estava na rua, homens, mulheres, novos e velhos acreditavam num país novo.

Nesta manhã de Abril, floriu a esperança de uma nação livre, livre de opressões, livre de guerra, livre de espírito, livre no sentir, livre de dogmas, livre nos direitos humanos e livre para construir uma democracia.

Foi com a revolução de Abril que os partidos deixaram a clandestinidade, os mais pequenos partidos puderam ambicionar ser maiores. Aqueles que outrora foram opositores seriam um dia poder.

Foi com a revolução de Abril que o poder local ganhou autonomia, que o poder local se modernizou e dinamizou políticas mais próximas das pessoas.

O país encheu-se de coragem e de esperança, porém nem tudo foi fácil, perigos como o Comunismo espreitavam esta neófita democracia comparada com a de outros países, no entanto foi suficientemente inspiradora a Revolução de Abril, tendo sido a menos sangrenta que ainda hoje é exemplo para o mundo.

Esta revolução serviu de nascente para o poder institucional e a génese da nossa Constituição.

Estes 35 anos de Democracia não são a meta mas sim o caminho que continuamos a percorrer na consolidação de uma sociedade mais justa, mais fraterna e mais livre.
No campo ideológico vive-se uma dinâmica globalizante de transformação diária. O mundo é hoje global e as exigências mudaram os paradigmas são outros e a atenção de todos é imperiosa para dar resposta às necessidades sociais de forma a combater as discriminações ainda existentes.

A participação cívica é hoje mais do que nunca obrigatória, a criação de novos movimentos cívicos são o baluarte e a garantia que Abril não acabou. O país está diferente, melhor na educação, melhor na saúde, melhor em muitas outras áreas vitais para a vanguarda de um país moderno e adaptado aos novos desafios.

Hoje 35 anos depois da revolução de Abril, o país está diferente, somos mais 2 milhões de portugueses. É um facto que as famílias têm menos filhos, hoje vive-se mais tempo e a chegada de novas culturas tornou-nos mais cosmopolitas, mais universais. Só com esta riqueza cultural é que poderemos voltar a estar na linha da frente, só assim os vários saberes poderão tornar-nos mais ambiciosos na ciência e na investigação. O mito Salazarista do “orgulhosamente sós”, há muito que não faz sentido, hoje somos Europeístas e não estamos num bunker isolados do mundo.

Contudo, não podemos anunciar que não existam perigos e que tudo está feito, é necessário agir, há outras preocupações, emergem novos perigos para a liberdade individual e colectiva, mecanismos ferozes e demolidores que podem ser nefastos para actual sociedade.

Paul Legrand ensinou que a educação é permanente, pois só assim a democracia é eficaz, os perigos das novas tecnologias quando se submetem à perversidade humana em vez do interesse social, podem desencadear o fracasso global. A sociedade necessita do seu próprio auto-controlo, precisa de se auto-regular. Esta auto-regulação não pode ser confundida com um sistema de controlo que debilite a democracia, porque se ocorrer uma deriva totalitária instrumentalizada nas mãos dos mais poderosos, a regressão ao passado é um pequeno passo. Não se pode permitir que a liberdade individual possa estar em perigo, não podemos aceitar que sejamos controlados electrónica e ideologicamente, e se aceite que toda a nossa vida seja reconstruída por outros e não por nós. A participação cívica de todos é mais uma vez um dos grandes desafios que temos pela frente, como disse há poucos dias o general Ramalho Eanes «É tempo de mudarmos porque já não temos tempo para continuar a ter medo. É tempo de mudarmos porque as linhas de futuro que levam ao futuro que desejamos são nós e mais ninguém que as pode abrir».

Se Abril abriu portas, estas jamais poderão ser fechadas. Os políticos têm de ser responsáveis porque são os actores das decisões e não podem construir um futuro que possa hipotecar gerações.

Por último e falando de nós, interior deste país, dois terços do nosso território, a vitimização da interioridade não pode servir de álibi para os responsáveis autárquicos que estrangularam e hipotecaram concelhos que hoje estão no caminho do definhamento destes municípios, a pouca inspiração e o comodismo instalado são hoje a maior preocupação do país.

Durante muitos anos tem se assistido ao mesmo discurso por parte de autarcas e políticos da nossa praça, que dizem: Somos interior ajudem-nos, combatamos as assimetrias, estamos esquecidos… Tem sido sobre esta batuta que os discursos se têm moldado, com mais algum tempero de malignidade e assim se fomenta a cegueira há muito instalada. Encontrem-se fórmulas, estratégias, ideias que possam contrariar este triste estrangulamento.

Por último e por surpreendente que pareça quero congratular a Autarquia da Mêda por finalmente e provavelmente a última sede de concelho deste país a colocar um nome de uma rua em comemoração à Revolução de Abril.

Que o sentido de Abril seja finalmente concretizado no nosso município muito em breve.

Termino, com palavras de Manuel Alegre:

Foram dias foram anos a esperar por um só dia.
Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía
com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia
na esperança de um só dia.

Viva o 25 de Abril, Sempre.


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