Intervenção na Sessão Solene da Câmara Municipal de Mêda
Comemorações do 25 de Abril – (25.04.2016)
E agora? Onde Estamos e para onde
vamos? Estas são as questões que nos devem inquietar, mas não menos importante
é recordar o ponto de partida. Sabermos de onde viemos, em que país vivíamos em
1974. Que país era esse, que circunstâncias eram essas… Há quem possa ficar
preso à história e ficar apeado ao passado, a ignorância ou mesmo o desprezo de
não queremos saber de onde viemos, por vezes, faz-nos caminhar para recriar uma
velha história com um final nefasto!
Mas falar de Abril é falar de
ruptura, de revolução entre dois mundos… De um país cinzento, sem
oportunidades, de um Portugal onde não havia o mais elementar de uma sociedade:
DEMOCRACIA! Esse mesmo país que mandava os seus jovens para Ultramar com uma
arma na mão para lutar numa guerra fratricida, de mães que viam os seus filhos
partirem para não os verem mais regressar.
Vivíamos numa redoma onde se
cultivava a narrativa do “Orgulhosamente sós”. Um país onde o analfabetismo era
norma, onde não havia direito à Saúde, onde os índices de pobreza eram enormes,
onde a miséria era o “Pão-nosso de cada dia!”, um país que não permitia o
laicismo, que promovia a discriminação de género, onde as mulheres eram
submissas a uma sociedade patriarcal, onde o direito ao voto era somente para
alguns. Um Portugal que não apostava na ciência e muito menos na investigação.
Um país com uma agricultura rudimentar e arcaica, um país isolado do resto da
Europa. Com uma enorme exploração infantil no mundo laboral. Um Portugal sem
glória, sem esperança, uma nação a definhar.
Mas foi com a Revolução militar, ao
comando dos capitães de Abril, que “emergimos dessa noite e do silêncio” para
um novo mundo, um mundo que permitiu abrir outras portas, que o saudoso Ary dos
Santos declamou com eloquência e efervescência, fazendo acreditar, que:
Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena (...)
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena (...)
Foi então, que pudemos escrever uma nova
história, a esperança de um outro mundo, um novo despertar, uma nova era, a
utopia apontava um admirável mundo novo sem pré-condicionalismos, sem
discriminações e com igualdade de oportunidades para todos. Com mais ou menos
utopia esse caminho foi-se fazendo e tanto se fez que permitiu que Abril abrisse portas a outras
revoluções, contagiando os nossos vizinhos Espanhóis e a diáspora da América
Latina.
Não podemos esquecer que corremos então o risco de nos termos deixado contagiar
com um outro regime totalitário, mas fez-se luz na “fonte luminosa” e a
democracia imperou. Os portugueses disseram Sim às eleições livres, onde homens
e mulheres puderam participar livremente. Depois, seguiram-se anos de grande
turbilhão e de amadurecimento.
Feita a “revolução dos cravos “com o fim
de uma ditadura de 48 anos, imperou a vontade de um povo que se quis erguer, contra
o totalitarismo e o sectarismo de décadas. Esse povo foi capaz de se modernizar
e de se adaptar a novos desafios, foi capaz de criar um Sistema Nacional de
Saúde gratuito e universal, de fazer surgir uma Escola Pública para todos, que
combateu os níveis de
iliteracia que nos envergonhavam e nos colocavam na cauda da Europa e do mundo,
obtivemos um sistema contributivo da Segurança Social que permitiu dar
dignidade a todas e a todos os portugueses.
Abril, trouxe a liberdade individual e
colectiva, oficializaram-se os partidos e com a sua diferença ideológica alcançámos
a diversidade política. Muito se discutiu e muitas vezes disseram: “olhe que
não! Olhe que não!”. Mas foi nessa diferença que os partidos amadureceram, se
criaram, e se tornaram o baluarte da Democracia. Mas o seu amadurecimento pode
putrificar-se, se não forem capazes de se adaptarem aos novos tempos e se não
souberem escutar o cidadão comum.
A democracia permitiu reclamar, permitiu
exigência, permitiu sonhar, e possibilitou também um olhar atento para o
exercício mais elementar num estado de direito – o respeito interinstitucional
e a sua distinta separação de poderes. É neste equilíbrio que se respira independência
e autonomia… é certo que não há donos da democracia, pois ela embriaga-se na
soma das partes e reveste-se no todo. A democracia é para todos, mas para que
seja efectivamente de todos é necessário sabê-la respeitar e implementar
diariamente os valores de Abril, que se encontram explanados na nossa
Constituição.
Respeitar a Constituição é louvar a
Democracia!
As diferenças ideológicas vêm de longe e,
se de um lado temos uma esquerda que lutou para que o espírito de Abril
permaneça vivo, e que todos os dias o estado garanta mais equidade, mais
justiça social, mais oportunidades; de um outro lado, encontra-se uma direita,
que chora pelas estatizações do período pós-revolucionário e que vive do
revanchismo que Abril prejudicou o crescimento da economia.
Há quem possa encontrar no chauvinismo a
cura para um povo e pensar que é a forma mais próspera de fazer crescer um
país. Desengane-se quem quiser trilhar esse caminho, esse será o precipício
para o País de há 42 anos atrás. O Portugal da miséria, da guerra e da
ditadura! Com todas as imperfeições da própria democracia, não descurando da
citação de Churchill: ”A democracia é a pior forma de governo
imaginável, à excepção todas as outras que foram experimentadas”, mesmo
com as devidas prudências, a democracia é o fermento da cidadania, da garantia
de um estado de direito.
Hoje somos um país da União Europeia, onde
há maior respeito pela dignidade do trabalho, pelos sindicatos e pela
democracia pluralista, somos mais cosmopolitas, mais poliglotas, mais
qualificados e mais bem preparados.
Mas há um outro lado que não podemos
escamotear, o lado da falta de oportunidades de emprego, da
precariedade laboral, do desprezo que certos actores políticos fazem da
cultura… Se a cultura é tudo aquilo que o homem acrescenta à natureza, então muito
se acrescentou nestes 42 anos de democracia, da Expo 98 ao Porto 2001, do Euro
2004, do CCB a Serralves, e tantos outros espaço culturais de referência
internacional.
Da Europa vieram dinheiros para asfaltar,
criar o saneamento básico, modernizar os espaços públicos e privados,
criaram-se dependências e novas vias rodoviárias, Lisboa ficou mais perto do
resto do país, mas neste país criaram-se assimetrias entre o Litoral e o
Interior, e essas vias de comunicação levaram o mais importante que restava
neste Interior, as PESSOAS! As terras fazem-se grandes com pessoas, sem pessoas
o exercício político torna-se inútil e desinteressante!
Cabe ao poder Central contrariar esta triste tendência e
finalmente conceptualizar-se uma promessa de há muito ”Coesão Territorial”. A recente unidade de missão para valorização
do Interior é um sinal positivo que aponta para uma nova esperança para este
território e nos dá algum fôlego e uma réstia de alento.
Nesta minha humilde descrição sobre o que foi a revolução de
Abril, não pronunciei uma única vez a palavra que é a semente e o mais de
grandiloquente desta revolução: A LIBERDADE!
Sem Liberdade, não se concretizam os 3 D´s da Revolução:
Descolonizar;
Democratizar e Desenvolver!
Contudo, chegou o tempo de acrescentarmos o quarto D.
DESCENTRALIZAÇÃO!
Por isso: Vamos fazer o que ainda não foi feito…
já que Abril nos ensinou que nenhuma
realidade, por mais negra que seja, é eterna ou imutável. Para os socialistas,
o 25 de Abril será sempre o dia da utopia, que se cumpre lutando por mais
prosperidade, justiça social, solidariedade, liberdade e democracia. Façamos
jus aos ideais! Concretizemos Abril!
Viva a Democracia!
Viva o 25 de Abril! Viva a Mêda! Viva Portugal!